domingo, 28 de dezembro de 2014

Diário de Obra



Mais um dia se inicia no canteiro de obras. Na entrada improvisada com uma guarita e dois portões, um para o acesso de pedestres e outro para o acesso de veículos, o vigia reclama da alta carga de trabalho logo pela manhã:

- "Tenho que fazer o crachá de duas pessoas, abrir o portão para a entrada de carros e ainda controlar o acesso dos pedestres. O computador está uma porcaria! Preciso de mais uma pessoa!"

Na reunião de DDS (diálogo diário de segurança), que é feita todos os dias antes dos operários iniciarem os trabalhos, um funcionário levanta a voz e reclama da comida do dia anterior. A técnica de segurança responde que a reclamação deve ser direcionada de forma organizada às pessoas realmente responsáveis. Mas não sei se ela foi compreendida. 

Depois de muitos meses é normal enjoar do tempero da comida. Na obra são servidas três refeições por dia, o café da manhã, almoço e o café da tarde. Se tiver turno da noite também é servido o jantar. 

O diálogo de segurança é importante para garantir que as regras de segurança, saúde e meio ambiente sejam atendidas. Com isso, diminui a ocorrência de acidentes.   

Um pouco depois, o faxineiro, preocupado com a ecologia, vê o cesto de lixo reciclável e comenta: 

- "Na lixeira está escrito bem grande PLÁSTICO e o camarada me joga uma casca de banana!" 

Além do faxineiro citado acima, trabalha na obra também o faxineiro Maxwell. Ele está tendo aulas com um dos técnicos de segurança para aprender a ler. Deixou a família no Piauí para trabalhar nas obras de São Paulo durante o período de entressafra da cana-de-açúcar. Seu objetivo é voltar para lá novamente na safra. Contou que lhe roubaram 200 "contos" por não saber ler. Disse que o colega foi ao banco depositar um envelope de dinheiro para sua esposa no caixa eletrônico. Depois recebeu uma ligação do próprio banco dizendo que o envelope estava em branco. Descoberto a falcatrua o colega disse que lhe daria 100 "contos", mas o faxineiro deixou para lá. Disse que iria considerar que gastou com bebedeira. Sendo que ele saía muito pouco do alojamento para evitar a tentação.

Enquanto uns fazem MBA, buscam experiências internacionais e estudam vários idiomas para romperem seus limites e alcançarem o desejado sucesso, outros ainda possuem como limitante o analfabetismo.  

Na hora do almoço os trabalhadores lotam seus pratos e enchem seus copos com um suco colorido e muito doce. Depois descansam acessando a internet nos seus celulares, jogando truco ou dormindo.   

Mais tarde se escuta de dentro do "contêiner", onde estão instalados os funcionários da área administrativa, o comprador com uma voz amigável fazer o primeiro contato com um fornecedor de equipamentos:

- "Boa tarde, tudo bom? Gostaria de falar com alguém da área comercial. Quero apresentar uma carta convite para adquirir um produto de vossa empresa".

Já é possível imaginar que após seis meses sua abordagem será diferente, mais ou menos assim:

- "Esse equipamento tinha que estar aqui ontem!! Eu já falei que dia 09 não é dia 10! Não vou pagar o aditivo do contrato..... Você já sabia desse custo..... Tinha que estar incluído....Vou cobrar multa por atraso....!!

Caminhando pela obra se escuta de longe o som do rádio de Rômulo. Um operário que trabalha o tempo inteiro escutando música evangélica no celular. É cego de um olho. Conta que foi de tanto apanhar do pai quando era criança. Diz que o perdoou, pois ele não sabia o que estava fazendo. 

No final do dia o técnico de segurança faz a sua última ronda. Ele é como um policial na obra. Fiscaliza se as normas estão sendo cumpridas. Encontra um grupo de funcionários trabalhando em cima de um muro sem o cinto de segurança. O diálogo transcorre mais ou menos assim:

- "Desce daí!! Não adianta colocar o cinto agora que eu vi que você estava sem cinto! Cadê o passaporte? Mostra! Passaporte vencido? Cadê a permissão de trabalho de vocês? Não tem? Cadê o selo permitindo o trabalho em altura? Não tem! Parem a atividade. Juntem as coisas todo mundo e me encontrem na área de convivência! da obra"!

E assim termina mais um dia. Em meio às estacas, aos blocos, ao concreto e das estruturas metálicas circulam as pessoas acumulando histórias e experiências de vida. 


sábado, 13 de dezembro de 2014

Os Vovôs do Rock'n Roll


Ver as lendas do Rock n' Roll subirem ao palco com mais de 70 anos de idade me faz refletir sobre a escolha certa da carreira. Será que um dia eles desejaram a aposentadoria? Parar de fazer shows, compor, ensaiar e gravar discos para curtir a família, viajar, descansar e tocar projetos pessoais? Pelo contrário, a impressão que eu tenho é que eles desejam morrer tocando, compondo, lançando discos, produzindo e criando.

Por outro lado, muitas pessoas trabalham a vida inteira sonhando com o esperado dia da aposentadoria. Trabalham  somente pelo dinheiro. Pelo sustento da família. Enquanto sonham com a vida que gostariam de ter. Tenho a impressão que isso acontece normalmente nos trabalhos onde mais se aperta parafuso do que se cria. E a atividade de apertar parafusos, não se aplica somente aos operadores braçais. Muitas pessoas com curso superior também passam a vida toda apertando parafusos metaforicamente falando. Ou seja, somente executam o que lhe pedem. Mesmo que diante de um computador. Não criam, não inspiram os outros e não são desafiados em seus trabalhos. Não constroem uma carreira pessoal, vivem à sombra das empresas onde trabalham.  

Me parece que essas pessoas tem uma visão deturpada do trabalho. Historicamente falando, isso pode estar relacionado com a escravidão, ou até mesmo com os traumas de filhos que viram seus pais saírem de casa infelizes para trabalhar somente pelo dinheiro. E também devido ao conceito de mais-valia, onde parte do valor da força de trabalho dispendida pelo trabalhador não é remunerada pelo patrão. Portanto ele é visto como uma coisa ruim. Que tira o seu tempo livre de ficar fazendo o que gosta e o substitui por atividades que não lhe agrada. Mas o que é liberdade senão o compromisso profundo com o que é melhor para você? 

E o que é trabalho então? Buscando rapidamente na internet encontrei que trabalho é "um conjunto de atividades realizadas, é o esforço feito por indivíduos, com o objetivo de atingir uma meta". E o que mais se encontra por aí são pessoas realizando trabalho para atingir as metas de outras pessoas. Por terem escolhido uma profissão que foi indicada pelos pais, pela televisão ou por parentes. Justamente por não saberem o que realmente querem. Mas essa meta não poderia ser a sua?

E nós simples mortais, não podemos trabalhar em algo onde desejemos morrer "tocando"? Exemplos de brasileiros que conseguiram isso são: Oscar Niemeyer, Ivo Pitanguy, Miguel Nicolelis, entre tantos outros engenheiros, empresários, padres e professores próximos a nós. Pessoas que  não são artistas mas mostram paixão pelo trabalho. Longe de desejarem que a aposentadoria chegue logo.  

Como encontrar então o trabalho que realmente te realize pela vida inteira? Eu não sei a resposta. Porém creio que ela passa por uma profunda reflexão do que é realmente importante para você. Por auto-conhecimento. Concluo esse artigo com o vídeo da música "Too Old to Rock'n Roll Too Young to Die" do Jethro Tull, uma crônica musical sobre alguém que se viu obrigado a se aposentar "trabalho" que tanto gostava!!

sábado, 29 de novembro de 2014

Expressões do Mundo Corporativo

                                                        
O uso de expressões nos permite alcançar uma comunicação mais clara no dia a dia. Nas empresas não seria diferente. Elas são muito usadas em reuniões ou discussões de trabalho para que a mensagem seja dita claramente. Separei abaixo algumas expressões engraçadas do mundo corporativo!

Discutir o sexo dos anjos

Normalmente acontece das pessoas se perderem quando estão discutindo um assunto técnico. Em vez de direcionar o assunto para a solução do problema ficam divagando sem sair do lugar. Discutem  algo sem importância prática. Nesse momento elas estão discutindo os sexos dos anjos!

Samba do crioulo doido

Usada quando a bagunça é generalizada. Por exemplo, quando um projeto ou documento não foi bem feito durante a fase de elaboração e consequentemente são encontrados muitos erros. Nesse momento pessoas de várias áreas são chamadas para discutir de forma a encontrar as razões do problema e propor soluções. Mas ninguém se entende.

Maluco do machado

Para a elaboração de um projeto de segurança de uma área, processo ou equipamento é necessário prever os sensores, as fechaduras, as barreiras e os desligamentos automáticos que irão proteger as pessoas de se acidentarem ou executarem uma operação perigosa. Como a possibilidade de ocorrer um acidente é quase infinita, discussões sobre as medidas de controle necessárias podem ser intermináveis. Por isso, em algum momento, alguém interrompe e diz: Só se aparecer o maluco do machado!! 

Eu não quero saber a cor da vaca, só quero beber o leite

Usada por gestores. Normalmente para cortar uma explicação muito detalhada de algum subordinado sobre um serviço ou um plano de recuperação. Para eles o que importa é saber que a data final será mantida e que os custos não irão estourar.

Sabonete ou liso

Define as pessoas que não resolvem um problema. Não se comprometem com uma atividade. Correm de um lado para o outro quando são cobrados ou chamados para responder por um serviço. Nesse momento escorregam feito sabonete deixando a responsabilidade para outros!

Pintar o Pavão 

Usado para informar que o tema será abordado de forma objetiva, sem ficar apresentando informações desnecessárias. Ou seja, sem pintar o pavão! 

terça-feira, 28 de outubro de 2014

Play the Game!




Para ter sucesso na carreira é preciso saber jogar o jogo, ou do inglês, “play the game”. Ou seja, é necessário conhecer as regras, fazer alianças, se dedicar ao que realmente importa, ter foco, entregar resultados e conhecer aonde se quer chegar.

Por outro lado, quem não sabe jogar o jogo coloca muita emoção nas questões profissionais, debocha dos gestores, leva tudo para o lado pessoal, mal sabe o que é feito na organização, não tem visão do todo e tem dificuldade em medir seus próprios resultados. Em resumo, é como um barco a deriva.

Usando o futebol como analogia, onze jogadores entram em campo enquanto a torcida fica do lado de fora gritando, berrando e torcendo, pois é o máximo que pode fazer. Quando o seu time perde choram, brigam, xingam, quebram ônibus e até se matam pois não sabem jogar o jogo, ou seja, não “play the game”. Alguns nem conhecem as regras. Por outro lado os jogadores se respeitam, trocam de camisa ao final do jogo, apertam as mãos, trocam de clube, respeitam as dificuldades uns dos outros. Sabem que não se faz o gol sozinho. Que é preciso fazer parcerias, receber os passes, construir as jogadas. Até mesmo o estado emocional influencia.

Acompanhando as discussões sobre as eleições presidenciais deste ano, me deparei com a mesma situação. Os eleitores me pareceram torcedores apaixonados por um determinado time sem conhecer as regras do jogo, sem saber como se operacionaliza as conquistas de um partido ou de um político. Enquanto de forma diferente os políticos se respeitam por conhecerem as praticas do jogo, apesar do calor das discussões quase levarem os adversários a ultrapassarem a barreira da ética. Vejo um distanciamento muito grande entre o povo apaixonado e os políticos que entram em campo.

A multidão decepcionada por sua vida não ter melhorado num passe de mágica, segue dando bofetadas no seu já conhecido Judas enquanto aguarda a chegada de um novo herói.

sábado, 31 de maio de 2014

Dos Encontros Sociais


Os encontros fora do expediente acontecem com relativa frequência. Alguns são os chamados "happy hours". Logo após o horário de trabalho, em um bar, com muito chopp e papo furado. Sem os familiares. Outros são os churrascos do setor, com ou sem os familiares, agendados com antecedência. Ocorrem após o horário do expediente também. Normalmente comemora-se o aniversario de alguém, a contratação de um estagiário, ou a despedida de um colega. Além desses encontros, há também as grandes festas de final de ano para todos os funcionários.

No "happy our" vai quem quer. O papo é democrático. Normalmente os chefes não estão presentes e são o assunto da mesa. Depois de falar do chefe o assunto muda para as fofocas internas e as especulações sobre os diretores que irão assumir ou deixar o cargo. O pano de fundo das conversas são as criticas à empresa. Ideias para a solução de todos os problemas da organização surgem aos montes, sempre muito bem articuladas. Uma pena que não passam da mesa do bar. Os demais temas são futebol, mulher, criticas ao Brasil e ao governo.

Nos churrascos da área as pessoas vão chegando em momentos diferentes. Primeiro a turma da organização vai acendendo a churrasqueira e enchendo os copos de cerveja patrocinada em parte pelos homenageados. Depois chega a turma que ficou uns minutos a mais na empresa fazendo hora extra. Por último os chefes. Eles também são os primeiros a irem embora. É um momento onde aquele funcionário que não se destaca por meio de resultados para a empresa, se destaca liderando a churrasqueira, a conversa e garantindo que todos estejam servidos. Os chefes e aspirantes ao cargo formam um grupinho e normalmente a conversa é sobre trabalho. A turma mais descontraída se diverte tirando sarro, dando risada e jogando truco. A ordem de saída da turma é inversa a de chegada.

As grandes festas de final de ano tem "boca livre". Em determinadas empresas ou escritórios são organizados "coqueteis", almoços ou jantares acompanhados de um farto "buffet" em um espaço de eventos. Nas indústrias normalmente são os churrascos dentro da fábrica mesmo! A informalidade do vestuário faz os diretores se confundirem com os demais funcionários. Por estarem acompanhados das mulheres e dos filhos humanizam a figura imponente deles. Tem pula pula para as crianças, cerveja para os adultos e música. Samba, pagode e sertanejo.

quinta-feira, 1 de maio de 2014

O Discurso do Rei


O diretor da empresa discursou na formatura dos alunos do curso técnico para jovens carentes oferecido dentro da própria companhia. O curso teve duração de um ano. Durante a apresentação, ele exibiu os indicadores com a quantidade total de alunos que já se formaram nesse projeto social e com a quantidade de alunos que foram contratados pela empresa ou foram aproveitados por outras empresas da região. No final enfatizou que os melhores foram contratados.

Essa última frase pode chocar a princípio. Pensemos nos adolescentes daquele grupo que não acumularam ainda vitórias em seus currículos, que foram criados por pais opressores e que não receberam muitos elogios durante a vida. Portanto os mais fracos ou piores. É normal nos sensibilizarmos por eles. Porém, deixemos de lado o paradigma que valoriza os fracos no lugar dos fortes, e que sempre nos faz torcer pelo time que está perdendo. Vejamos as coisas pelo olhar do diretor.

Por que não valorizar os melhores? Buscar os que mais se destacam? As grandes organizações escolhem os melhores porque a sua existência depende disso. É importante procurar ser o melhor no que faz para contribuir com os outros e com a sociedade usando o máximo das suas possibilidades. Mas você pode se perguntar, onde se encaixam os que não são os melhores em nada? A boa notícia é que não nascemos prontos. Estamos em processo de mudança e evolução ao longo da vida. Devemos olhar para nossos adolescentes e ver uma obra em criação. Um rascunho. Em um ambiente propicio ao desenvolvimento e com um empurrãozinho na direção certa eles se tornarão pessoas de sucesso no que se propuserem a fazer.

Entretanto, fomos criados acreditando que uns nascem melhores que os outros. O tal do "dom". Que ou a pessoa é ou não é. E que, portanto alguns estão fadados ao fracasso por não demonstrarem grandes habilidades na infância ou na adolescência. Acreditamos que a vida inteira é uma fotografia do presente.

Por que não ver a vida como um filme onde gravamos nossa história acumulando muitos erros e acertos? Um engenheiro precisa estudar cinco anos e acumular pelo menos mais cinco de experiência  prática para estar apto a exercer plenamente a profissão. Ninguém nasce engenheiro.

Valorizemos então os fortes porém, sem excluirmos os fracos. Criemos um ambiente onde eles encontrem suas vozes para que possam contribuir melhor com a sociedade usando o máximo do seu potencial.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Ainda sobre as demissões


O medo de ser demitido é sem duvida a principal preocupação dos profissionais do setor privado. Por mais que não se goste do que faz, o dinheiro que vem no final do mês é importante para pagar as contas, consumir, alimentar os filhos, entre infinitas outras coisas. Como viver em paz então sabendo que o fantasma da demissão pode aparecer a qualquer momento?

Abaixo quatro sugestões para te ajudar a lidar com esse fantasma!

1) Evite ser demitido

Pode parecer obvio, mas muita gente faz corpo mole no serviço, reclama pelos corredores e parece não gostar do que faz. Deixe a hipocrisia de lado e se entregue de cabeça ao trabalho. Seja grato por estar empregado. Trabalhe bem, contribua para o bem da empresa, seja pontual e confiável. De alguma forma você precisa dela, caso contrario você não gastaria suas horas de sol lá!

2) Mantenha sua empregabilidade em alta

Mantenha seu currículo atualizado, tenha uma boa rede de contatos e um plano B engatilhado. Faça cursos, de palestras, estude, leia. Mesmo seguindo a dica numero 1 pode ser que você seja demitido e dessa forma encontrara uma recolocação rapidamente. 

3)  Tenha uma vida financeira saudável

Gaste menos do que ganha. Mantenha uma poupança com o valor de pelo menos 6 (seis) vezes os seus gastos mensais. Isso te ajudara a manter seu padrão de vida por 6 (seis) meses enquanto estiver desempregado. Tente ter uma uma renda a mais alem do seu trabalho.

4) Crie sua própria fonte de renda

Saber que você é capaz de criar renda sem depender de um patrão traz uma segurança. A fonte de renda pode vir da compra e venda de alguma coisa, da abertura de uma pequena loja, de uma franquia ou da venda de comida na rua. Se você não tem um capital inicial para investir, ofereça seus serviços de limpeza, de consultoria, de cozinheiro, de costura, de manutenção de computadores, enfim, use sua criatividade e seja livre. O Sebrae e a revista Pequenas Empresas Grandes Negócios pode te ajudar nesse processo.


quinta-feira, 24 de abril de 2014

Das Demissões



No corredor da empresa, duas pessoas conversam sobre o recente acontecimento:

- “O Renato foi mandado embora.”

- “Nossa! Serio? Já foram 3, só essa semana!”

Ambos ficaram um tempo em silêncio. Internamente uma mistura de dois sentimentos. O primeiro de felicidade por não terem sido eles os demitidos. O segundo de angústia porque sabiam que o cerco estava se fechando.

Renato tinha 45 anos. Era um funcionário mediano. As verdadeiras razões que o levaram a ser despedido nunca foram totalmente conhecidas. Isso é comum nas empresas. Talvez tenha sido uma imposição da diretoria devido a uma necessidade de redução nos custos do setor, baixa carga ou mesmo algum desentendimento com o chefe. 

Um pouco mais tarde Renato passa nas mesas das pessoas mais próximas se despedindo com um sorriso sem graça no rosto e os olhos úmidos.

- “Ate mais e obrigado por tudo...”, dizia Renato, entre outras coisas.

- “Que isso? Não foi nada. Boa sorte e mantenha o contato”, respondiam as pessoas sem saberem exatamente o que dizer e sem graça por não se sentirem merecedores dos agradecimentos.

Após a passagem de Renato, as pessoas se encaram cerrando os lábios e levantando as sobrancelhas num tom de lamentação. Algumas arriscam um palpite para o seu desligamento, outros tecem comentários revoltosos se referindo a tamanha injustiça.

Mais tarde, todos recebem um email de despedida composto de agradecimentos aos colegas e a empresa, uma reflexão poética e os contatos pessoais, numa tentativa de manter as portas da empresa abertas.

quarta-feira, 12 de março de 2014

Uma Reunião Pontual


Já estava no final do dia. A secretaria do departamento passa no corredor gritando o seguinte aviso:

- “Amanha haverá uma reunião com o Diretor às oito horas da manha no auditório. Chegar com pelo menos 10 minutos de antecedência!”

Brasileiro tem fama de chegar atrasado nos compromissos. Atrasar uns 15 minutos pelo menos já é considerado normal. Faz parte da programação. Por isso a necessidade da secretária enfatizar a obrigação com o horário.

Ninguém ia querer chegar atrasado numa situação dessas. Por isso todos ouviram o aviso com muita atenção e se prepararam com muito esforço para cumpri-lo. Uns teriam que acordar 10 minutos mais cedo, outros teriam que modificar a rota para o trabalho. Numa clara indicação de que a maioria não está acostumada a cumprir horários.

Porém, ao contrário dos atrasos que se vê no dia a dia, influenciado pela nossa cultura, quem leva a carreira profissional a sério pratica e valoriza muito a pontualidade. E não poderia ser diferente. Por terem agendas apertadas, diversos compromissos ao longo do dia e várias decisões para tomar, eles valorizam o seu tempo e se aborrecem com quem os atrasa.

No outro dia, conforme o combinado, todos se dirigiram para a reunião com a antecedência solicitada. Uns saíram sozinhos, outros em pequenos grupos. A maioria, enquanto se levantava, chamava os outros.

A reunião se iniciou no horário marcado, o microfone e o projetor já estavam testados e funcionando. Todos estavam em seus devidos lugares. Tudo correu dentro do esperado e toda a pauta da reunião foi cumprida.

No mesmo dia, a tarde, houve uma reunião entre 10 pessoas. A maioria deles tinha participado da reunião com o diretor na parte da manhã. 

Como de costume, o organizador da reunião chegou atrasado e começou a conectar o notebook no "datashow". Enquanto ele ia resolvendo os erros de conexão que apareciam, os outros iam chegando, ocupando seus lugares, comentando sobre os últimos acontecimentos do noticiário ou da empresa. Normalmente era mais de um assunto em paralelo. Não tinha cadeira para todos na sala, pois a sala agendada era para 6 pessoas. Em função disso, as pessoas tinham que pedir cadeiras emprestadas nas baias próximas. Com 20 minutos de atraso a reunião se iniciou. Metade das pessoas estavam ali sem saber por que tinham sido convocadas. Ao final, não foi possível passar toda a pauta. Foi necessário agendar outra reunião!